DANIEL FRANCISCO NAGAO MENEZES
A Constituição brasileira de 1988 tem como uma das
principais características a participação popular na gestão da coisa pública.
Saindo de um período centralizador, a Constituição permitiu que a participação
popular se alargasse além das eleições para representantes do Poder Executivo e
Legislativo.
De modo inovador, a Constituição de 88 elaborou um modelo
de participação que envolve dois tipos de teorias democráticas: A Teoria
Deliberativa[1] e
a Teoria Participativa[2].
A Constituição Federal adota um modelo de participação
popular através da criação de vários conselhos, em todos os níveis da federação
(união, estados e municípios). A partir deste modelo de conselhos, várias
políticas públicas são formuladas, executadas e fiscalizadas a partir da
atuação dos conselhos.
Ocorre que, o modelo de conselhos adotados pela CF/88
traz um modelo híbrido dentre as várias teorias democráticas, não se filiando
rigidamente a nenhuma das teorias da democracia discutidas na Ciência Política.
Nas esferas mais elevadas, normalmente no governo
federal, os conselhos possuem característica deliberativas pois, são compostos
por representantes de determinadas categorias profissionais e econômicas, que
deliberam em nome da categoria que representam, normalmente com a participação
do ente governamental.
Os conselhos nos níveis mais elevados da administração
pública possuem como características a regulação de determinados setores da
vida social, como acontece nas participações deliberativas das Agências
Reguladoras, ou ainda, nas decisões sobre gestão, como acontece nos conselhos
gestores como, por exemplo, o conselho gestor do FGTS.
Porém, a democracia deliberativa, não se aplica no âmbito
local, pois, a estrutura da Constituição é voltada para a participação direta
da população, se aproximando das teorias participacionistas.
Aqui, tanto as formulações de políticas públicas como a
execução destas políticas é baseada na estrutura de conselhos, com a diferente
para a esfera federal de que, no nível local, não é representativa de
determinados grupos, mas sim, franqueada a toda a população
indiscriminadamente.
Considerando que a participação nos conselhos locais é
permitida a qualquer cidadão e, os conselhos locais possuem uma natureza
executiva, sendo os exemplos os conselhos municipais de meio ambiente, que além
de planejar o desenvolvimento sustentável local, tem poder de aprovar ou rejeitar
projetos envolvendo meio ambiente. Outro exemplo são os conselhos tutelares que
executam as políticas públicas envolvendo crianças e adolescentes.
A grande crítica a esta construção conselhar da
Constituição é a sobreposição quase integral entre esfera pública e sociedade
civil. A CF/88, ao permitir e regular que a participação na administração
pública é ampla e via conselhos, acaba por diminuir o espaço da sociedade civil
para se organizar fora do estado, limitando assim, a organização da sociedade
civil segundo a organização dos conselhos, principalmente no nível local nos
quais as organizações sociais se constituem para interagir com o poder público
local.
Notas:
[1] A
democracia deliberativa constitui-se como um modelo ou processo de deliberação
política caracterizado por um conjunto de pressupostos teórico-normativos que
incorporam a participação da sociedade civil na regulação da vida coletiva.
Trata-se de um conceito que está fundamentalmente ancorado na idéia de que a
legitimidade das decisões e ações políticas deriva da deliberação pública de
coletividades de cidadãos livres e iguais. In
LUCCHMANN, LÍGIA HELENA HAHN A
DEMOCRACIA DELIBERATIVA: SOCIEDADE CIVIL, ESFERA PÚBLICA E INSTITUCIONALIDADE. CADERNOS DE PESQUISA PPGSP/UFSC, Nº 33,
NOVEMBRO 2002
[2] “Os ideais da democracia participativa
atestam esta centralidade da auto-determinação do povo, enfatizando a dimensão
pedagógica da política. Para Pateman (1970), a participação é educativa e
promove, através de um processo de capacitação e conscientização (individual e
coletiva), o desenvolvimento da cidadania, cujo exercício configura-se como
requisito central na ruptura com o ciclo de subordinação e de injustiças
sociais. A participação confere um outro ciclo, caracterizado pela relação
direta que se estabelece entre a participação cidadã, a mudança da consciência
política e a diminuição das desigualdades sociais (MACPHERSON, 1978). Esta
concepção republicana de democracia caracteriza-se por conferir à sociedade o
poder ou a autoridade originária e legítima da formação da opinião e da vontade
comum (HABERMAS, 1997). De maneira geral, pode-se dizer que o conceito de
democracia participativa construído sob o viés rousseaniano, assenta-se em uma
concepção de política apresentada como um fim em si mesma, na medida em que
está preocupada com a generalização e aprofundamento da cidadania enquanto
auto-determinação da população na definição e construção da vida e do interesse
comum.” In LUCCHMANN, LÍGIA HELENA HAHN A
DEMOCRACIA DELIBERATIVA: SOCIEDADE CIVIL, ESFERA PÚBLICA E
INSTITUCIONALIDADE. CADERNOS DE PESQUISA
PPGSP/UFSC, Nº 33, NOVEMBRO 2002
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